Sob o foco
http://www.timeout.pt/news.asp?id_news=2819
Homem de sete ofícios mas sempre com o fado como fio unificador, Helder Moutinho acaba de editar um novo álbum, Que Fado É Este que Trago? É uma pergunta que tem várias respostas mas que podem resumir-se numa só: o seu enorme amor ao fado, ao antigo das vielas de Alfama ou da Madragoa, ou aos outros que aí virão ou que, nele, já convivem com a tradição. Porque o fado até pode ser “maldito” sem deixar de ser possível trocar as voltas ao destino
A primeira pergunta, inevitável, é: afinal, que fado é este que trazes?
Também não sei muito bem. É o meu fado, o fado em que eu acredito. E é todo o fado, desde o tradicional até aos chamados fados-canção e aos originais, que ainda não sabemos muito bem se são fados e que, obviamente, ainda não são clássicos porque são novos, embora um dia possam vir a ser considerados como tal se forem aceites pelo grande público e até pela comunidade fadista. Sei que sou fadista, não caí aqui de pára-quedas, mas no fundo não sei lá muito bem qual é o meu fado.
Neste álbum criaste ou recriaste fados ao jeito tradicional, embora com letras ou músicas novas...
Sim. O “Labirinto ou Não Foi Nada” tem letra de David Mourão-Ferreira mas a música é minha, que eu compus com a estrutura de um fado tradicional, sem refrão. E chamei-lhe “fado labirinto” porque muitas das músicas de fados antigos onde podem caber várias letras diferentes assumem o nome da letra original. Por exemplo, o Fado Cravo, do Alfredo Marceneiro, chama-se assim porque a letra original falava de um cravo.
O tema que dá nome ao disco tem música é do Yami, que é angolano. E há quem diga que o fado nasceu em Angola, viajando depois para o Brasil e do Brasil para cá...
Pois, mas este fado não tem nada a ver com isso. O Yami tem uma particularidade interessante: ele nasceu em Angola, filho de mãe angolana, mas o pai é minhoto. Mas, apesar de na sua maneira de tocar ele ter muitas raízes africanas, ele veio para Portugal muito novo e está muito integrado no meio do fado. Em relação à origem do fado, acho que ele nasce de uma série de outros estilos que se encontram numa cidade portuária, Lisboa. E essas influências vêm de Angola, do Brasil, Índia, Moçambique... E é bom não esquecer os 700 anos em que os mouros cá estiveram. O fado é a convergência dessas melodias todas.
Neste álbum, à semelhança do que acontecia no teu espectáculo Maldito Fado, há instrumentos exteriores ao formato do fado: o acordeão e as percussões.
O Maldito Fado teve bastante influência na génese deste disco de estúdio. Os outros instrumentos não são uma novidade – a Amália e o Carlos do Carmo fizeram-no – mas foi uma experiência que decidi fazer porque são instrumentos vindos de outros géneros musicais. Como se fossem outras perguntas que eu faço.
António Pires
segunda-feira, 29 de Dezembro de 2008